27.9.07

Marylin Manson no Brasil

A adolescência é uma fase difícil, todos sabem. Na tentativa de encontrar sua própria identidade (geralmente em oposição à dos pais), uns põem piercings pelo corpo, outros mudam a cor dos cabelos, outros ainda pintam o rosto ou vestem roupas espalhafatosas. E há os que fazem tudo isso ao mesmo tempo, como boa parte da platéia do show de Marilyn Manson na última quarta-feira (26), em São Paulo.

Conhecido como "anticristo superstar" por suas virulentas apresentações ao vivo, seu visual de filme de terror, seus vocais gritados e uma série de bem-planejadas atitudes chocantes, Marilyn Manson atrai naturalmente para seu show todo tipo de pessoa afeita a comportamentos exagerados e rock de temática sombria. O que se viu no palco do Via Funchal, porém, foi um performer mais maduro, menos apelativo e (felizmente) de calças o tempo todo.

O cantor e sua banda (formada atualmente pelo guitarrista Tim Sköld, o baixista Rob
Holliday, o tecladista Chris Vrenna e o baterista Ginger Fish) apresentaram o show de divulgação de seu álbum mais recente, "Eat Me, Drink Me", lançado em junho de 2007. O repertório foi exatamente o mesmo do show no Rio de Janeiro no terça-feira (25), passando por seus sete discos de estúdio em pouco mais de uma hora e 20 minutos de apresentação.

Sem nenhum adereço além de duas bandeiras com as iniciais "MM" sobre os amplificadores, o show transcorreu consideravelmente pacato, levando em conta o prognóstico do cantor. Nenhuma Bíblia foi rasgada, nenhum segurança foi bolinado (ele já sofreu alguns processos por isso) e nenhum sangue foi derramado, a despeito do microfone-facão que Manson usava durante as duas primeiras músicas. Coincidência ou não, assim que os fotógrafos e cinegrafistas foram mandados embora, o cantor livrou-se do adorno pontiagudo e seguiu com um microfone normal.

Maturidade aos quase 40
Sem contar as piadas inevitáveis --até os humoristas do Pânico na TV apareceram na porta do Via Funchal--, a profusão de corpetes, botas de cano alto, sobretudos e montagens gótico-burlescas na platéia sugeria uma pergunta que Marilyn Manson já deve ter feito a si mesmo: o que fazer com esse radicalismo todo quando a juventude passa, e com ela, a necessidade de chocar pela diferença?

Pois bem, Brian Hugh Warner (nome verdadeiro do cantor) já está com 38 anos e dez discos nas costas: sete de estúdio, um ao vivo, um de remixes e uma coletânea. Como já deve ter carros demais, Manson deu boas-vindas à meia idade trocando a mulher pela atriz Evan Rachel Wood, 19, e fazendo um disco em sua homenagem, o citado "Eat Me, Drink Me". O trabalho é menos "visual" que os anteriores, e isso se reflete no show, focado na boa performance da banda e na resistência vocal de Manson -- que se não é a mesma do último show no Brasil, há exatos dez anos, ainda impressiona.

Não que o cantor ignore seus antigos personagens: coloca o chapéu e terno de gângster para cantar "mOBSCENE", encarna o andrógino psicopata em "Disposable Teens" e "Irresponsable Hate Anthem" e recupera o zumbi de cinta-liga em "Sweet Dreams (Are Made of This)", versão do Eurythmics que o apresentou ao mundo, e na irresistível "Beautiful People", última música do show. Mas ele parece mais concentrado em apresentar seu novo "eu", sincero e apaixonado, de músicas como "Heart-Shaped Glasses" e "Putting Holes In Happiness".

Para o azar desse novo Marilyn Manson, seu talento como compositor é bem menor que seu tino para criar imagens poderosas. O público que enche o Via Funchal permanece eufórico durante todo o show, mas a empolgação se deve muito mais a músicas de clipes conhecidos como "Rock Is Dead" e "The Dope Show" do que a baladas arrastadas como "If I Was Your Vampire" e "Just a Car Crash Away", ambas do novo disco.

De qualquer maneira, não se pode acusar Marilyn Manson de estagnação estética -- ao contrário de seu público brasileiro, que continua fiel à fase "zumbi de cinta-liga" ou ao manjado visual gótico de sobretudo preto e crucifixos. Ao invés de seguir querendo chocar a burguesia com trajes sadomasoquistas e auto-mutilação, o cantor busca agora uma certa sobriedade, sem ignorar as imagens de seu passado. Com um show um pouco mais caprichado e um disco de melhores composições, talvez possamos ter o melhor dos dois mundos na próxima oportunidade.


Setlist do show em São Paulo:
"If I Was Your Vampire"
"Disposable Teens"
"mOBSCENE"
"Irresponsable Hate Anthem"
"Just a Car Crash Away"
"Sweet Dreams"
"Lunchbox" (trecho)
"The Fight Song"
"Putting Holes In Happiness"
"Heart-Shaped Glasses"
"The Dope Show"
"Rock Is Dead"
"The Reflecting God"
Bis: "Beautiful People"



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